Junho chega e com ele vem o clássico: “Já estamos no meio do ano… e o que eu fiz até agora?”
Momentos de tensão…
Sim, ou talvez não. Como é junho pra você?
É curioso como, de forma quase que automática, essa pergunta surge — como se precisássemos nos justificar pelo tempo que passou. Como se a vida nos cobrasse algum tipo de prestação de contas.
Ou será que somos nós que estamos nos cobrando?
Talvez os planos feitos no início do ano não estejam correndo como planejado, ou talvez até estejam indo tão bem que ainda é junho e, uau, que ano! Alguns planos podem nem fazer mais tanto sentido assim, e os novos já chegaram sem aviso.
Por aqui, o mês de junho chegou diferente. O clássico “já estamos no meio do ano” veio, mas ao invés de pedir a prestação de contas, junho me fez olhar para os meses de janeiro a maio de um jeito diferente. Ele me perguntou:
Quantas experiências você já viveu esse ano?
E dessas, quantas delas realmente digeriu?
Tenho viajado por quase seis meses e até agora o movimento fez todo o sentido: descobrir lugares, aromas, sabores, deixar que o novo me atravessasse, transformar essa newsletter — que antes era Bálsamo e agora é Curiosa — quase que em um manifesto de vida e, com esse movimento todo, repensar meu jeito de existir no mundo.
Mas agora o corpo, o tempo e o silêncio parecem me chamar para algo mais interno. Um desejo de acalmar e assentar. De cuidar do que ficou.
Dar o tempo de a vida se humanizar.
E por que não continuar? Por que não seguir viagem para outros países, agora que estou muito mais perto deles do que do meu? A resposta que me vem é uma pergunta:
É preciso mesmo seguir agora?
Te confesso que a ideia de parar e voltar me deu uma sensação de desistência, de que estou renunciando a muitas coisas novas que viverei se continuar, e de que a volta é uma espécie de fracasso. Veja só.
Mas olhei nos olhos da sensação de desistência, sentei com ela na beira da cama e deixei que ela se expressasse. Ela me olhou de volta e perguntou:
O que, de fato, precisa continuar — e o que está pedindo assentamento na sua experiência hoje?
A frase “dar o tempo de a vida se humanizar” foi inspirada em um texto da Ana Fiedler.
A Ana escreve sobre o movimento dos astros, e foi na costura entre as palavras dela — sobre a lunação taurina recente — e as minhas inquietações, que essa edição nasceu.
e como é bom deixar a lua revelar aos poucos, em cada canto nosso, no tempo mais lento, o da terra, que cai tão bem ao corpo.
este é o tempo real para a vida se humanizar.
e essa lunação é para sentir em cada poro, a revolução e a transformação.
e tem coisa que gasta tempo para se transformar, custa muitas idas e vindas naquele mesmo lugar.
sustentar uma revolução pode ser um processo lento, que para começar levanta nossas estrelas pro ar, e depois custa acomodar cada pedaço de vida no seu lugar.
Humanizar a vida, para mim, é aceitar a nossa condição de seres em processo. Seres que aprendem pela tentativa, que erram e voltam atrás, que vivem não só com a mente, mas principalmente com a pele, com o coração, com o corpo inteiro.
Sinto que há muito dentro da gente esperando para ser digerido. Já parou para pensar que a digestão acontece justo nos ciclos? Nas fases que vivemos de tempos em tempos, assim como as estações do ano?
A vida humana cresce, se desenvolve e prospera em um tempo natural que é bem diferente da vida gerada pela tecnologia. A vida humana vive no tempo da alquimia, não do clique.
E acomodar cada pedaço de vida no seu lugar é o que meu íntimo me diz para fazer agora.
Posso seguir para outro país? Sim. Mas… e tudo o que vivi nesses meses? Será que não posso ficar mais um pouco com essas sensações? Levar comigo para minha cidade natal e, por alguns meses, tê-las como companhia nos meus cafés da manhã antes de dar um oi para a África ou para a Indonésia?
Quero deixar o vivido penetrar em cada célula do meu corpo. Quero que seja memória corporal e não só lembrança mental.
E mais do que querer, preciso.
Mas como saber se é hora de continuar ou assentar?
Não há uma resposta certa para essa pergunta — ou melhor, para nada na vida — e tudo bem.
Talvez a resposta esteja na própria pergunta, no espaço que ela abre, e nem sempre será fácil responder. Às vezes o corpo diz uma coisa, a mente diz outra, e a sociedade vai dizer o contrário.
Mas existe algo fértil nesse lugar entre um passo e outro. Entre o ir e o ficar.
Assentar não é uma desistência, mas sim deixar o vivido se revelar por inteiro.
Dar um pouco mais de espaço para sentir o que foi sentido, abrir caminho no corpo para que o conhecimento se transforme em sabedoria.
Num tempo em que tudo parece pedir mais — mais metas, mais respostas, mais movimento — nos pergunto:
Onde preciso me dar tempo? Onde não estou me permitindo ser humana?
Sejamos curiosas aqui.
A armadilha da intensidade
A intensidade pode ser maravilhosa. Mas quando se torna constante, sem pausa e digestão, ela vira cansaço e compromete a nossa vitalidade.
A busca incessante por experiências, aprendizados e conquistas pode nos desconectar da nossa humanidade. Da nossa capacidade de nos relacionarmos com o tempo das coisas, com o conflito, a dúvida, a dualidade, os paradoxos e a necessidade de parar para processar sem nos culpar como se fosse uma perda de tempo.
A intensidade tem seu lado bom, mas viver constantemente buscando os picos também nos entrega ansiedade, insônia, dificuldade de nos concentrar, sensação de atraso, insatisfação e falta. Sinais de um corpo que só quer ser humano. Sinais de uma alma que precisa de tempo para processar.
Nos devolvendo para a nossa humanidade
Quando tudo gira depressa e eu reflito sobre como a tecnologia estará daqui a 10 anos e sobre como lidaremos com essa revolução sem precedentes, me pergunto sobre o que me ajudará a não me perder de mim e qual é o chão que terei para pisar.
E a resposta retumbante que me vem é:
a conexão humana.
A nossa habilidade de nos conectar com outros seres e juntos cuidarmos uns dos outros para que possamos utilizar toda essa revolução de uma forma que nos dê suporte ao florescimento daquilo que mora no nosso coração, e não o contrário.
A conexão humana como comunidade, ponte, espelho, campo de experimentação, integração e humanização do aprendizado intelectual.
Talvez seja disso que mais precisaremos daqui pra frente — da nossa capacidade de criar laços que nos lembrem do que somos. Olhar para a humanidade e lembrar que o tempo certo não é o que acelera mais, mas o que nos permite sentir com integridade e tempo.
Cuidar uns dos outros pode ser até uma forma política de sustentar a vida.
E que, no meio do ano, no meio do mundo, no meio de tantas pressas, a gente possa se permitir parar um pouco e ser somente humanos feitos de ciclos.
Pessoas são lugares
Lugares são altares
Janaína Portella
Eu sinto que “zerei a vida” quando estou na troca com as minhas amigas. É uma sensação de profunda nutrição, amparo, acolhimento e amor. Quando estamos no conflito é desafiador, claro, mas quando o nó é dissolvido, mais um degrau de consciência é subido e me nutro igualmente.
Chego a me emocionar quando me lembro desses momentos, pois acredito profundamente na conexão humana como casa de florescimento da vida de um jeito real e fértil.
Escrevi essa edição como quem oferece um cobertor macio — para mim e para você — num dia em que o que parece ser desistência pode ser só um convite para se aconchegar, esquentar os pés e deixar tudo se assentar.
Por uma vida mais humana.
Por um ritmo mais possível.
Por um cuidado que vai além das exigências.
Com presença,
Paty.
Recados da Curiosa
Estou nos preparativos finais para a divulgação do Vida boa de se viver — uma experiência de aprendizagem online para quem deseja voltar a viver com prazer, presença e intenção.
Se você sente que a vida está sem cor, que os dias têm passado rápido demais e você quer voltar a se sentir viva, deixa um comentário que te envio uma mensagem pelo chat assim que estiver tudo pronto.
Vida boa para se viver é um convite à reorganização interna e à criação de uma vida mais criativa, leve e cheia de sentido — do seu jeito e no seu tempo. 💛
Chegou como uma coberta quentinha aqui, me abraçando num momento onde estou aprendendo a ficar um pouco mais com o que já tenho e onde já estou também
Peguei aqui esse cobertor macio e quentinho e me cobri com ele toda. Obrigada Paty pelas belas palavras.